Quando
somos bem vindos...
O ser humano é uma criatura contraditória
pela sua natureza e habilidades, como afirmam uns, dadas por deus. Na
verdade, pouco importa, para a maioria, por que conseguimos ser tão
engenhosos, principalmente quando o assunto se refere ao outro. Temos
uma inteligência espetacular e, por isso, somos capazes das mais
magníficas invenções como também das piores atrocidades. O que
importa realmente ou deveria interessar seriam as relações que
construímos entre nós. Mas, nestas relações desmistificamos
saberes, sempre um tanto polêmicos, e por mais que intelectuais
tentem esclarecer fatos ou questões escrevendo e palestrando, sempre
existirão divergências obscuras que insistem em rondar nossas vidas
e a nos aterrorizar.
Escritores, temos muitos e honrados, mas
não fazemos grande progresso ao escrevermos “difícil”, pois
escrevemos apenas para uns poucos, o que
precisamos é realmente nos
comunicar com as pessoas que nem sempre leram um livro sequer em sua
longa e conflituosa temporada pela Terra. Nem sempre podemos
culpá-los também e disso sabemos. Existem circunstâncias e mais
circunstâncias, sejam religiosas, políticas ou econômicas, com
interpretações diversas para garantir que informações sejam
dissimuladas ao sabor praticamente individual. Afinal, o capitalismo
sobrevive graças a essa habilidade não dada por deus, certamente.
Mesmo assim, tem quem se negue a apreender
tal capacidade e tente em vão “tirar do sono” mentes alienadas
para incomodá-las nas noites mais tranquilas de suas vidas. Mulheres
e homens propagam ideias em que demonstram habilidades irracionais
que contrariam a essência que se difunde a respeito da existência
de um ser superior originalmente bom. E quando pensamos nos
imprevistos ou previstos aos quais nos expomos, como a explosão de
mais uma vida desejada ou inesperada neste planeta, as línguas
malvadas começam a trabalhar.
Conforme o livro consagrado, foi Eva quem
ofereceu a fruta a Adão que pecou não por culpa dele, mas de sua
amada companheira. Parece-nos bastante familiar o significado destas
palavras no país em que vivemos. Já em países considerados de
primeiro mundo, como Estados Unidos, Alemanha, Grécia, Itália,
Austrália, entre tantos outros; a interrupção do feto pode ser
realizada até a décima segunda semana da gestação, a pedido da
mulher. No entanto, no Brasil, a legislação é mais rigorosa porque
o aborto só é permitido “...legal
em casos de risco de vida, gravidez resultante de estupro e
anencefalia fetal, e proibido em todos os demais casos”.
Mas será que podemos considerar isso um avanço ou um atraso?
Sem dúvida alguma, depende da
circunstância, aliás, penso que de todas as circunstâncias.
Neste caso, a primeira,
inquestionavelmente é a necessidade pessoal para que cada um possa
se manter vivo e confiante neste mundo e, a segunda e a terceira,
direta ou indiretamente, para que governos e demais líderes possam
também se manter vivos e recompensados.
Como escreve e canta Caetano Veloso “ e
na TV se você vir um deputado em pânico mal dissimulado/...plano de
educação que parece fácil/...e o venerável cardeal disser que vê
tanto espírito no feto/e nenhum, no marginal”;
parece-nos uma contradição toda essa discussão. No
entanto, mesmo sendo polêmico demais, temos que ler, escrever e
refletir sobre isso e sobre tantos outros assuntos que provocam mal
estar, principalmente entre os grandes chefes; ainda que os
resultados dessas tensões nos deixem mal também.
Todavia, o fator principal neste texto
ainda não é a legalização do aborto, e sim, uma questão anterior
a este. Frequentemente ouvimos e lemos a história de um bebê
encontrado no lixo e, imediatamente, as autoridades locais se
mobilizam para encontrar a mãe por meio do exame DNA para que possa
ser punida conforme a legislação vigente em nosso país. A
indignação diante disso não é a punição que a mãe sofrerá,
pois independentemente da circunstância, existem outras saídas,
porém tenho certeza absoluta que um bebê de proveta jamais será
abandonado. Ou será que não se consegue descobrir a paternidade da
mesma maneira que a maternidade e nem mesmo de outra?
Lamentavelmente, penso que quando uma mãe
abandona um filho, este já o foi também pelo pai. Aliás, neste
caso, o pai já fez um aborto
(genético) quando ele “corta
o cordão umbilical” antes do nascimento e comete outro aborto
(social) quando se exime da
responsabilidade afetiva, financeira e, portanto do sustento e da
educação como um todo. Mas a lei não é para o homem, talvez por
ainda pensarmos que quem oferece a maçã é sempre a Eva e seu amado
ingenuamente a degusta e, por ser tão inocente não consegue saber
que frutas dão sementes e que sementes podem brotar e ... explodir
em vidas! Então, cadeia para as frutas Evas
brasileiras, pois conforme
o Código
Penal Brasileiro,
em vigor desde 1984,
a detenção
será de “um a quatro anos, em
caso de aborto com o consentimento da mulher,
e de três a dez anos
para quem o fizer sem consentimento”. E para o pai? Bem, este não
tem nada a ver com a história de seu filho ...
E enquanto assim for, nós, mulheres, temos
uma tarefa importante neste mundo: cuidar quando e em que condições
nos tornamos mães, pois as responsabilidades ainda são muito árduas
e só nossas. O pai pode negar e abandonar a criança, mas a mãe,
jamais. Se esta não assume a criança é considerada prostituta,
irresponsável e outros chamamentos mais grosseiros que estes. O pai
já não sofre julgamento algum por parte de alheios. Embora tímidas
e lentas mudanças estejam ocorrendo no que diz respeito à
paternidade, ainda que ineficientes, são importantes porque
alimentam esperanças.
Desse modo, sabendo que a responsabilidade
maior pela educação do filho cabe às mães, mesmo nos casos em que
a mulher cumpre a mesma jornada que o homem fora de casa, então
talvez seja fundamental que comecemos a pensar antes de continuar
propagando ideias envelhecidas como essas porque mais tarde, os
meninos se tornarão estes homens de quem estamos falando hoje. Com
certeza, essa é uma polêmica nada fácil se ser discutida, pois
está carregada de valores e costumes milenares. Trazer essa conversa
para sala de aula e oferecer acompanhamento psicológico aos pais
também, pode, com certeza, amenizar os efeitos colaterais inerentes
à questão aqui tratada.
Iliane Teresinha Müller
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